A cidade de Poços de Caldas sempre foi uma das pioneiras em atrações culturais e esse fato pode ser atribuído à economia, que nasce e se desenvolve buscando atender o alto número de turistas que visitavam a estância em busca das águas termais, de bem-estar e, nesse sentido, apreciação pela arte. Com o cinema não foi diferente: desde os chamados teatro-cinema do começo do século XX até os dias atuais, a atividade cinematográfica passou por diversas transformações, mas ainda continua presente na vida do poços-caldense.
Cine Teatro Politheama (1911)
A história da sétima arte na cidade tem início em 1911, com a abertura do Cine Teatro Politheama, um grande espaço cultural onde música, cinema e teatro se reuniam nos espetáculos da época. Ali foram promovidas as primeiras sessões de cinema da cidade. Ainda muito pautado pela "era" do glamour dos cassinos, o público que frequentava o Politheama era mais elitizado, deixando grande parte da população sem acesso às exibições.
Cine Vogue (Década de 1940)
O cenário começa a mudar no início da década de 1940, quando o imigrante italiano Edoardo Marras inaugura o primeiro cinema de rua de Poços de Caldas: o Cine Vogue. Localizado na Rua São Paulo, o espaço funcionou por quatro décadas e foi responsável por aproximar o público do universo cinematográfico. Diferente das tendências atuais, o Cine Vogue contava com apenas uma sala, capaz de acomodar quase mil espectadores, transformando cada exibição em um verdadeiro espetáculo coletivo.
Eduardo "Titi" Marras, atual proprietário e filho do fundador, destaca que o Cine Vogue marcou gerações e consolidou uma tradição de encontro e lazer na cidade, tornando-se um símbolo da era de ouro dos cinemas de rua em Poços de Caldas.
Cine Ultravisão (1979)
O primeiro passo em direção à modernidade foi a inauguração do Cine Ultravisão, em 1979. Sendo o cinema mais antigo ainda em atividade na cidade, o Ultravisão passou por diversas fases e mudanças ao longo de sua história, tendo, no início, apenas uma sala com mais de mil e duzentos assentos, que, com o passar do tempo, se transformou em quatro salas de espaço mais reduzido, até se tornar, em 2022, o Cine Marquise Ultravisão.
Com quase 50 anos de funcionamento, o Cine Marquise Ultravisão tem raízes no cinema de rua do século passado, mas sem deixar de acompanhar a modernidade. Localizado bem no centro da cidade, segue sendo referência em qualidade e conforto.
Desafios e Retomada
A jornalista e ex assessora de imprensa do espaço Aline Fallaci conta que o grande desafio pós-pandemia é reaproximar o público das telonas, seja pelo fator econômico ou pela falta de interesse gerada pelos serviços de streaming. Dessa forma, nos últimos anos, foram realizadas ações com entradas gratuitas para mais de três mil pessoas, a fim de resgatar essa antiga relação entre o poços-caldense e a magia proporcionada pelas exibições cinematográficas.
Essa retomada de público e de interesse cultural abriu espaço para o fortalecimento de novas iniciativas voltadas ao cinema e à arte na cidade. Entre elas, destaca-se o Instituto Moreira Salles (IMS), que se consolidou como um dos principais agentes de transformação cultural em Poços de Caldas.
Instituto Moreira Salles
Com uma proposta democrática, que combina ingressos acessíveis e uma curadoria plural, o Instituto aproximou efetivamente a população da cultura, tornando-se um espaço de encontro, reflexão e aprendizado. A transformação na forma como Poços de Caldas passou a consumir e produzir cultura revela-se profunda e duradoura.
É nesse contexto que segundo o responsável pela curadoria de cinema do IMS, Marcelo Leme, o consumo de filmes e documentários no espaço se manifesta, como expressão do impacto contínuo do IMS na construção de uma identidade cultural mais consciente, plural e voltada para o futuro:
"A gente consegue dar luz a filmes que, em outros momentos, jamais acabariam sendo vistos, pelo menos na telona, e disseminando assim linguagens, olhares, coisas que são tão importantes para a nossa própria identidade", disse.
Transformação Cultural
O surgimento dessa nova relação entre Poços de Caldas e o cinema marcou um verdadeiro ponto de virada na trajetória cultural da cidade. Mais do que uma simples mudança de hábitos, representou o despertar de uma produção autoral disposta a se afastar da lógica estritamente comercial, abrindo espaço para a experimentação e a valorização da expressão artística. Nesse cenário de efervescência cultural, a inauguração do Instituto Moreira Salles em Poços de Caldas consolidou-se como um marco essencial.
Sua relevância é inegável: é a única unidade do IMS fora de uma capital brasileira, um reconhecimento explícito do peso simbólico e criativo da cidade. Mais do que revitalizar as manifestações locais, especialmente no campo do cinema, o Instituto se tornou um verdadeiro divisor de águas. Ao propor uma programação que se distancia dos grandes blockbusters, o IMS possibilitou o desenvolvimento de um olhar mais crítico, sensível e diversificado sobre a arte cinematográfica, firmando-se como um instituto de formação, troca e expansão de repertórios culturais.
Dessa forma, o Instituto Moreira Salles consolidou-se não apenas como um espaço de difusão artística, mas como um agente transformador da vida cultural de Poços de Caldas. Sua presença reconfigurou o modo como a cidade se relaciona com o cinema e com as demais expressões culturais, estimulando o surgimento de novos públicos, criadores e perspectivas. Mais do que abrigar exibições ou eventos, o IMS tornou-se um símbolo da vitalidade cultural poços-caldense, um ponto de convergência entre passado e futuro, tradição e inovação, que continua a inspirar uma comunidade cada vez mais participativa, crítica e consciente de seu papel na construção da própria identidade.
O poços-caldense pode optar também pelo Cineflix, localizado no Shopping Partage, além das mostras de cinema realizadas em eventos pela cidade.
As cortinas do antigo Politheama podem ter se fechado há algum tempo, mas a cidade continua projetando histórias na vida daqueles que ainda têm o prazer de desfrutar da arte, mostrando que, mesmo com os diversos avanços do mundo tecnológico, a história do cinema em Poços de Caldas está longe de chegar aos créditos finais.
